A descoberta da escritura deste autor, artista plástico reconhecidíssimo, prêmio Jabuti de Literatura. O interesse veio de uma entrevista que vi na teve a cabo, em que ele era apresentado como escritor. O espanto de descobrir um literato rigoroso, com dicção própria, estilo conciso e surpreendente. Contos e microcontos tensos, prenhes de suspense. A presença do insólito mostrado de uma forma diversa, na linha do espanto, entetanto sem espalhafato, sem movimentos de prestidigitador que quer desconcertar a plateia. Prosa de traços poéticos, pesando aqui e ali a força de uma narratividade. Personagens mais próximo de esboços, muitos não nomeados. O predomínio de uma voz em primeira pessoa que conta sempre sobre sua relação com um outro e se constrói a media em que o outro rui. Não me furto a dizer que há nesse livro diversas obras-primas da narrativa curta. Pontuo as minhas: "Eu peço ao vento", "A única chance dela", "Tuas ordens". A experimentação e a beleza inconsútil de "Dentro do pátio sem luz", com seu flerte lascivo com a poesia. Curto. Curtam.
Embaixo, colo uma resenha da VEJA, de Carlos Graieb
Até agora, o paulistano Nuno Ramos podia ser visto como um artista plástico dotado de habilidade especial para lidar com palavras. Ele havia lançado um livro em 1993, Cujo, no qual demonstrava ter ouvido afiado, talento para articular idéias e criar imagens. Na comparação, talvez deixasse envergonhado muito escritor profissional. Misto de diário e coleção de aforismos, o texto permanecia, no entanto, bastante colado ao trabalho de Ramos no ateliê. Várias páginas eram elucubrações de um escultor às voltas com vidro, areia, asfalto ou breu. Dificilmente o leitor se esquecia de estar diante de um artista cuja maior vocação era expor suas obras na galeria, e não na estante.
Com o lançamento de seu segundo livro, O Pão do Corvo,Nuno Ramos finca os dois pés na literatura. Pode-se notar, é certo, uma continuidade em relação a Cujo. Há trechos de prosa poética em que o autor se debruça com lupa sobre a matéria, analisando sua textura e sua composição, procurando dar à linguagem uma qualidade tátil. A diferença está na dose bem maior de narratividade. Nos dezessete textos curtos do novo livro, Ramos procurou fugir da "experiência pessoal" e deu maior espaço à imaginação. Há brevíssimas fábulas, como Cinza, que fala de um povo misterioso que aguarda a aniquilação pelo fogo. Em outros casos, como Ele Canta, seres fantásticos são descritos. Filosofices sobre arte e a linguagem ainda têm lugar, como em Cujo, mas seu contexto é ficcional. Um vago sabor da literatura de Franz Kafka e Jorge Luis Borges atravessa as páginas.
É difícil situar Ramos entre os autores brasileiros. Ele tem certa afinidade com um Rodrigo Naves ou uma Vilma Arêas, que exploram o microconto. Mas não se deve forçar a comparação. Nuno Ramos começa a conquistar espaço próprio.
Carlos Graieb
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