sexta-feira, 15 de abril de 2011

FICÇÃO INTIMISTA

Para construção de um texto mais preciso sobre Literatura Intimista, fiz recortes de trechos de considerações de Nelly Novaes Coelho, um tanto pulverizadas, mas que parecem no final traduzir certa sensibilidade literária que explora no texto questões como narrativa de introspecção, a partir de uma busca existencial que prescruta a condição humana dentro de um cotidiano (dramático que a tensiona). Um literatura de crise da interioridade, também de um estar-no-mundo.

Abaixo, recortes.

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FICÇÃO DA CONDIÇÃO HUMANA

O drama humano é enfocado sob o prisma da inquietação espiritual ou do depoimento cultural.

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FICÇÃO DESENVOLTA

De filiação naturalista (ousado desvendamento dos chamados aspectos sujos ou baixos do comportamento humano ou da engrenagem social), a diretriz que estamos chamando de "desenvolta" é, basicamente, uma literatura de contestação à sociedade de consumo (que é a dominante hoje em todo mundo). Extremamente variada nas soluções encontradas pelos escritores que a constroem, ela se apresenta sob diversos registros: o do realismo cru/satírico; o do urbano/erótico ou a do naturalismo exacerbado que procede ao inventário mais ou menos indiscriminado do real enfocado.

Amor, sexo, vitalidade, sátira, cinismo, baixeza, violência, ausência de calor humano, desespero frio ou sarcasmo corrosivo... são alguns dos elementos que podem ser encontrados nessa matéria "desenvolta", onde o "argumento", a "intriga" é o que menos conta. Sua principal meta é a desmistificação dos valores convencionais que nos governam. Através de banalíssimos acontecimentos filtram-se os motivos essenciais da narrativa: problemas morais ligados ao sexo (tabus da moral cristã), ou obsessão sexual amoral; o papel do acaso na determinação do destino; a violência gratuita; o esmagamento das aspirações humanas por um ambiente estreito e sem horizontes ou por um sistema hipócrita e asfixiante. Registrando as situações ou as relações humanas com uma objetividade, quase fotográfica por vezes, seu verismo desabrido é alimentado não pelo desejo de "documentar", mas por uma profunda tensão entre o sujeito e o mundo mistificado que o rodeia. Note-se, porém, que de modo geral não é uma literatura "fechada" à realização da condição humana, pois há nela como que uma explosão de forças vitais à procura de uma nova canalização para a ação, pressentida num amanhã bem próximo. Duas frases de Samuel Rawet definem bem esse estado de espírito que se abre para um novo humanismo: "Percebo que não preciso de respostas para prosseguir. Preciso de perguntas" e "Deus está no futuro". É esta, portanto, uma literatura que não busca respostas (como o foi a existencialista sartriana), mas que tenta descobrir novas perguntas... Embora nem todas as obras que relacionamos apresentem, evidentemente, a mesma violência ou a mesma cínica visão-de-mundo, todas participam da mesma natureza "desenvolta", insolente ou desabrida.

(...)

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FICÇÃO DO COTIDIANO DRAMÁTICO

O mundo apreendido através de um "eu". Sondagem mais ou menos tensa das motivações do comprotamento humano, ocultas na área do subconsciente. Narrativa de enfoque realista, que se preocupa com as relações humanas no dia-a-dia, centralizadas nos eixos: amor (ou sexo)/solidão (ou insegurança)/ Trabalho (ou dinheiro) sob o prisma da rotina esterilizante.

Continuando a estrutura tradicional do romance (conto ou novela), em que o argumento é fator-alicerce, os escritores que deste momento em diante produzem nessa diretriz, embora não se destaquem pelas tentativas experimentalistas de descobrir uma nova linguagem e uma nova estrutura ficcional, na verdade já estão longe do padrão convencional. Apresentam com maior ou menor intensidade a preocupação com as sendas abertas nos esquemas ficcionais, realizadas pelos narradores-inventores desde as primeiras décadas do século (= fragmentarismo da narrativa; quebra da sequência temporal lógica; utilização do monólogo interior ou do foco narrativo em 3a. aderido a uma personagem; estilo indireto livre, a tendência às frases curtas, ao devassamento dos dramas a partir de pormenores aparentemente insignificantes; a criação de uma "atmosfera" que vem mais do sugerido do que do narrado, etc.).

Entre os que iniciaram sua obra no período anterior e os que agora começam, destacamos:

Marques Rebelo
Lygia Fagundes Telles
Fernando Sabino
Otto Lara Resende
Breno Acioly
Aníbal Machado
Orígenes Lessa
Ledo Ivo
Mário Donato
Josué Montelo
Dinah Silveira de Queiroz
Moreira Campos
Ricardo Ramos
Osman Lins

pp. 291-3

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FICÇÃO DO HUMANISMO DRAMÁTICO: na linha narrativa de linhagem psicológica prossegue a ficção voltada para as relações humanas (ora apreendidas em registro realista-objetivo, ora em sondagens introspectivas) e predominantemente condicionadas por três fatores básicos: o amor (e/ou sexo); a solidão interior (e/ou insegurança) e a ação vitalmente esterilizante da rotina diária. Adensa essa narrativa a sondagem das causas ocultas da conduta ou dos gestos aparentes, numa linha de influência freudiana, psico-analítica. A estrutura narrativa, embasamento tradicional, apresenta-se já enriquecida com as mais diferentes técnicas novas.

Literatura e linguagem - A obra literária e a expressão linguística. Nelly Novaes Coelho. Rio de Janeiro. 5a. edição. Ed. Vozes. 1993. p. 339-340.

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